Amós Oz faz uma curiosa apresentação de dez obras
marcantes da literatura universal, a partir de como elas se apresentam como um
“contrato inicial” entre o leitor e o autor, a partir de seus inícios, ou seja,
de suas palavras introdutórias.
As obras que Amóz Oz elegeu para a sua arguta e
criativa interpretação são as seguintes: Effi
Briest, de Theodore Fontante; “Na flor da idade”, de S.Y. Agnon; “O nariz”,
de Nicolai Gogol; “Um médico de aldeia”, de Franz Kafka; “O violino de
Rothschild”, de Anton Tchekov; Mikdamot,
de S. Yizhar; História: um romance,
de Elsa Morante; O outono do patriarca,
de Gabriel García Márquez; “Ninguém disse nada”, de Raymond Carver; “Um
leopardo particular e muito apavorante”, de Yaakov Shabtai.
Obviamente que o autor só pode falar dos inícios das
referidas obras porque as leu integralmente, e, com certeza, várias vezes. Em
razão disso, ele nos ilude ao nos induzir a pensar que só o início da obra é
suficiente para que o leitor se convença a lê-la.
Na realidade, penso que esse tal “contrato inicial”
não se consuma a não ser que a obra seja lida em sua totalidade. Daí, sim, fará
sentido crermos, como leitores, que, de fato, fomos convencidos desde as
primeiras palavras de uma narrativa a percorrê-la em lento e degustativo
caminhar.
Em outras palavras, o surpreendente ou convidativo
início do relato só pode ser assim avaliado, se cotejado com seu trajeto
posterior até o desfecho. De outro modo, seremos frustrados leitores de uma
página só.
Na introdução, Amós Óz faz um lúdico exercício,
dirigido, a meu ver, para escritores neófitos, sobre possibilidades de se
iniciar uma narrativa: “Você tem vontade de escrever? ‘Shmuel ama Tsila’?
Simplesmente siga adiante e escreva. Quer escrever ‘mas Tsila ama Gilbert’? Vá
em frente. Deseja acrescentar ‘no entanto, Shmuel e Gilbert amam um ao outro’?
Quem pode desmenti-lo? Quem pode aparecer e desafiá-lo com informações
contraditórias ou com fontes que você talvez não tenha consultado?” (p. 7).
(Trad. Adriana Lisboa) (Ediouro)
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